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O Brasil É um País de Deficientes

Ari Heck

Uma análise sobre o Censo 2000, especificamente em relação aos dados das pessoas portadoras de deficiência.

Depois de milhares de reivindicações e finalmente o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) incluiu nos questionários do censo um item específico dos PPD’s (pessoas portadoras de deficiências).

Pela primeira vez, o Brasil conhece e tem uma radiografia da população PPD. Hoje, finalmente sabemos quantos somos e onde estamos. Até poucos dias atrás, o País usava os dados estimativos da Organização Mundial da Saúde (OMS) e em cima deles os governantes executavam as suas plataformas administrativas. Talvez por isso, hoje entendemos porque nunca foram suficientes os recursos aplicados nesta área.

O PPD é segundo o Decreto Federal n.º 914/93, "aquela pessoa que apresenta, em caráter permanente, perdas ou anomalias de sua estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, que gerem incapacidade para o desempenho de atividades, dentro do padrão considerado normal para o ser humano". Em cima dessas definições o IBGE buscou radiografar a realidade sócio-econômica dessas pessoas.

Segundo a OMS, os deficientes se dividem em: deficiência física (tetraplegia, paraplegia e outros), deficiência mental (leve, moderada, severa e profunda), deficiência auditiva (total ou parcial), deficiência visual (cegueira total e visão reduzida) e deficiência múltipla (duas ou mais deficiências associadas).

Há uma discrepância enorme entre os dados da OMS e a realidade fática do Brasil. Isso já foi tema de debate em muitos congressos onde dizia que os dados eram muito maiores do que aqueles que nos apresentava. Para ilustrar, vamos fazer um comparativo entre os números que vinham sendo apresentados e os números do IBGE, que se diga de passagem, muito confiáveis e com margem de erro muito pequena.

Tipo de deficiência Dados da OMS Dados do IBGE Número de habitantes (em milhões)
Mental 5% 1,24% 2,09
Física 2% 0,59% 0,99
Auditiva 1,5% 2,42% 4,08
Visual 0,5% 6,97% 11,77
Múltiplos 1% - -
Motora - 3,32% 5,6
Total 10% 14,5% 24,5
Dados: OMS e IBGE censo 2000.

Como podemos perceber, os dados são muito diferentes daqueles que o País usava até a semana passada. Mas, ao analisar mais detidamente esses dados, nos assustamos porque encontramos uma população de mais de 24,5 milhões de brasileiros portadores de algum tipo de deficiência. Dentre os deficientes visuais, 159.824 responderam que são incapazes de enxergar. Já entre os brasileiros com deficiência auditiva, 176.067 responderam que são incapazes de ouvir. Os dados do Censo mostram ainda, que os homens predominam no caso de deficiência mental, física ("especialmente no caso de falta de membro ou parte dele") e auditiva. O resultado é compatível com o tipo de atividade desenvolvida pelos homens e mostra que os acidentes de trabalho vem contribuindo no aumentando desse índices. Já as mulheres predominam no índice dificuldades motoras ("incapacidade de caminhar ou subir escadas") ou visuais, o que até certo ponto é coerente porque elas dominam na composição por sexo da população e idade acima de 60 anos. Também, ao somarmos o número de deficientes físicos com o dos motores, temos um total de 3,91% de pessoas com dificuldades físicas, ou seja, 6,59 milhões de brasileiros.

Os dados que estavam disponíveis nesta área, além de serem parciais e contraditórios, eram estimativas de países em desenvolvimento mas com dificuldades muito menores que o nossos. Segundo o professor Wilson Scarpelli, em recente comentário ao Censo 2000 disse que: "Os dados censitários de 1980 a 2000, disponíveis na página do IBGE na internet, permitem visualizar razões para a crescente insatisfação popular, observável pelo aumento de índices de criminalidade e de reclamações em geral. A alegria de ser brasileiro vem diminuindo paulatinamente, transformando-se em preocupação".

Finalmente, conseguimos mostrar a cara do Brasil deficiente. Conseguimos mostrar que de cada 100 brasileiros, no mínimo 14 apresentam alguma limitação física ou sensorial. Esta última em número muito maior em relação àquela. Por outro lado, os dados nos jogam para uma dura e triste realidade. Onde estão estes cidadãos e estas cidadãs? Estão trabalhando? Estão na escola? Tem acesso à saúde, ao lazer, ao prazer...? É, são perguntas que não podem calar diante de tais dados. Não podemos deixá-los sem resposta. Afinal, estamos num novo século, num novo milênio, na era tecnológica... Vinte e quatro milhões e quinhentos mil brasileiros(as) esperam por estas respostas. Está na hora da Nação "pagar" a dívida que tem conosco.

Servidor Público e portador de deficiência física, um desses 24,5 milhões.

22/ 05/ 2005
Ari Heck


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